Sim, vou deixar de fazer Sumo de Kiwi.
Este é o meu último texto. Vou escrevê-lo sem fazer correcções: o que sair é o que fica. E sinto que vai ficar enorme.
Existem algumas razões para decidir deixar de escrever aqui: em primeiro lugar porque as realidades informáticas alteraram-se, ou seja, se dantes eu escrevia as minhas notas, pensamentos e textos aqui, actualmente divido isso entre o Facebook e os jornais onde vou escrevendo, actualmente n’ “O Torrejano”; em segundo lugar porque pretendo alocar o tempo que perdia a organizar o blog (ultimamente muito pouco) noutras prioridades, nomeadamente num projecto pessoal que tenho desenvolvido lentamente mas que aparecerá; em terceiro lugar porque, na verdade, duvido que alguém leia isto sem ser por caridade.
A liberdade de pensar. De sonhar. De imaginar. Foi isso que, juntando a outras coisas, nunca me fizeram desistir. Quando, por vezes, ficava à noite abraçado ao Gui num recanto escuro e chorava em silêncio para ninguém ouvir a única coisa que me era permitido fazer sem ser castrado era pensar. É por isso que gosto tanto de pensar. Penso o que eu quiser. Sou o que quiser. E armo bases para que nunca ninguém se esqueça que eu existo.
Neste entretanto, perdi o João.
Já alguma vez acordaram de um sonho em que parece que estão a cair de um prédio e não há terreno firme para pisarem? Essa é a denominada sensação de chão a fugir dos pés.
Agora imaginem o que é sentir isso. Sem ser a sonhar. Sentir isso bem acordados.
Eu senti. Não queiram sentir.
No dia em que vi o João na cama do hospital soube que ele ia morrer. Saí do quarto completamente alucinado. Lembro-me de bater com a cabeça numa janela do Hospital de Santa Maria e de alguém me tentar agarrar antes de cair desamparado no chão a chorar como se me tivessem tirado, precisamente, o chão que piso.
Se essa dor já passou? Não. Claro que não.
Nem nunca vai passar. Perder assim o nosso melhor amigo é uma doença crónica.
Há uns dias disse a alguém que “posso um dia conseguir tudo o que uma pessoa deseja, tudo o que se possa imaginar mas faltar-me-á sempre o João”. Isso impede-me de ser plenamente feliz. É impossível adormecer sem pensar no João.
Mas não, não tenham pena de mim. Eu não quero pena.
Quero que pensem como os vossos amigos são importantes, quero que vivam todos os dias dando graças de poder estar com eles, quero que cheguem ao pé dos vossos amigos, dos vossos pais, de quem vos é importante e não tenham medo de lhes dar um abraço e dizer “amo-te”.
Acreditem, porque eu já aprendi, que essa é a maior riqueza que temos na vida.
Eu dava tudo, tudo mesmo, para poder por mais uma única vez ver o sorriso do João, dar-lhe um abraço e dizer-lhe “amo-te puto”.
A minha mãe é, indubitavelmente, a pessoa mais importante a quem ainda posso dizer “amo-te”. Se eu sofri nestes 4 anos, ela sofreu ainda mais. Se eu chorei, ela chorou a dobrar. Se eu lutei, ela lutou sem ter forças. Devo-lhe mais do que aquilo que algum dia conseguirei dizer.
Amem. Digam que amam. Cheguem a casa e dêem uma flor à vossa mãe. Um dia vão querer dá-la e não podem. Dêem-lhe um beijo na testa em sinal de carinho e ternura. Fiquem em casa, à noite, a fazer-lhe companhia.
Acreditem, porque eu já aprendi, que não se vão arrepender.
Acreditem, porque eu já aprendi, que é a sensação mais reconfortante que podem ter.
Continuo a ver no meu irmão um exemplo.
Sei que, sem o exemplo que ele sempre me transmitiu, eu provavelmente teria descarrilado e seria hoje uma pessoa esquecida, frustrada e revoltada comigo próprio.
Ganhar-lhe um jogo de Trivial continua a ser o desafio da minha vida. Mas não é por aí que ele é um exemplo. Ou melhor, é por aí também mas é mais pela força que ele sempre teve.
Não é. A minha vida foi, em certos períodos, demasiado sofredora para que eu hoje ignore o que sentia quando chegava à noite e ele era o único amigo que tinha, o único conforto. Eu sei que ele me percebia, não duvidem. Sei que me olhava e se agachava em mim como quem quer dar um abraço.
Sei que ele será sempre na minha vida muito mais que uma memória longíqua, muito mais que um parágrafo num blog ou muito mais que dois caracteres chineses tatuados nas minhas costas.
É um amigo. É alguém de quem tenho imensas saudades.
Outras pessoas marcaram e continuam a marcar a minha vida.
Não vou falar tão pormenorizadamente mas quero deixar o devido obrigado a essas pessoas, muitas das quais já mencionadas no post Mudança, de 8 de Julho de 2008:
- à Ti Mina e ao Titó que foram muitas vezes meus pais e pelos quais terei sempre um carinho proporcional à dívida que nunca lhes conseguirei pagar pois fizeram por mim algo que nunca imaginei que fosse possível;
- à minha prima Sílvia que me dá a mão a toda a hora para que eu não tenha a tentação de cair;
- à Joana (Companheira) que eu continuo a amar como se ama uma irmã;
- à Ti Nanda, ao Cesário e à Patrícia que, mesmo com todos os azares, tiveram sempre algo para me oferecer: principalmente um conselho, uma mão amiga ou uma força que não nos deixa desistir;
- ao Manel e ao João Paulinho que continuam a fazer-me sorrir só de sorrirem;
- à Carlota que, inexplicavelmente, deu uma luz nova à minha vida. Vê-la sorrir torna tudo tão mais simples;
- ao Carlos que sempre se ofereceu para me proteger e eleva para lá de primo a condição que nos une;
- aos pais do João onde encontrei duas pessoas incrivelmente prestáveis e amigas com as quais terei eternamente uma ligação familiar;
- à Beta e à Cristina, também, porque, de formas diferentes, sabem sempre como me confortar o espiríto;
- à Sofia que, muito embora o tempo e a vida nos tenha levado para rumos distantes, continuo a ter por ela um carinho enorme que distância nenhuma conseguirá alguma vez apagar;
- ao Fábio, ao Filipe, à Ânia, à Mariana, à Sofia Raquel, à Tanixa, à Teles, à Núria, à Carolina, à Susana, à Marta, ao Jorge, à Sofia Frazão, à Solange, à Filipa Pedro, à Petxa, à Rita Vieira e à Inês, que tiveram, e muitos continuam a ter, uma importância extrema na minha vida;
- ao David que me mostrou como se podem ultrapassar todas as barreiras e como a verdadeira amizade sobrevive sempre;
- às professoras Leonilde e Cristina, duas mulheres que não consigo esquecer e ao professor Sérgio que, hoje reconheço, incutiu em mim valores importantíssimos;
- ao Ricardo, à Raquel, à Nini e à Marta, o melhor que ainda hoje guardo de Coimbra.
- ao Tiago, que tem valores indescritivéis como ser humano e uma das pessoas que mais orgulho tenho em conhecer;
- ao Tavares que, após estes anos todos, continua a ser um bom amigo no qual posso sempre confiar;
- à Daniela, que se revelou uma pessoa extraordinária e sem a qual a minha vida já não seria igual;
- ao Luís André, ao Nuno Miguel e ao Rui Flora, três amigos para além da condição que essa palavra oferece. Encontrá-los, em qualquer altura da minha vida, faz-me sempre lembrar dos melhores momentos da minha vida. Ao Rui, destaco também, o exemplo que ele é enquanto pessoa;
- à Rita porque será sempre um motivo de alegria na minha vida. Imagino-me daqui a 20 anos, ambos adultos com vida própria, e ainda a dizer piadas parvas um ao outro. O sorriso daquela míuda e a relação que tenho com ela não tem preço;
- à Diana, que será sempre a minha eterna namorada;
- ao Francisco e à Matilde. Não encontro palavras que justifiquem o que é estar com aqueles meninos. Um dia que saia de Lisboa, eles serão provavelmente a melhor recordação que levo;
- a todos aqueles que me têm dado a mão nestes anos e que eu não mencionei por puro lapso.
Falei-vos de Fernando Pessoa, Sporting, Fado, Paz, Liberdade, Literatura, Amor, Música, Amizade, Arte, Cinema, Religião, U2, Bruno Aleixo, Maradona, Princesa Diana, Aung San Suu Kyi, Nelson Mandela, Memórias, História, Política, Sociedade, Economia, Desporto ou simplesmente sobre a minha vida. Existem outras que vos falei menos ou nem sequer mencionei mas que fazem parte de mim de uma forma ou de outra. A Gouxaria, e o Boomerang em particular, são coisas que me deixam saudades.
E eu sou aquilo que penso. Serei sempre.