
Podia, como fiz no segundo post que escrevi no
Sumo de Kiwi ("Fernando, uma genial Pessoa"), fazer acerca de Raúl Solnado uma sinopse do que foi a sua vida profissional.
Não quero. Podia, mas não quero.
Isso vou deixar para quem percebe, para quem sabe, os críticos e os que o viram em palco no auge da sua carreira.
Sei pouco de Solnado. Sei muito do Povo.
Solnado era do Povo.
Como o Fialho Gouveia, que nos disse um "Até Já" ou como o Carlos Cruz.
Estes três apresentaram um dos mais cómicos programas de Humor em Portugal. Digo-o porque o sei, porque o comprovo na RTP Memória (sim, este canal é o expoente máximo de serviço público). As suas interpretações de Ludgero Clodoaldo são maravilhosas!
Sim, porque actualmente existe em Portugal a tendência para confundir Humor com Brejeirice. Solnado fazia Humor, do bom.
"
Ensinou a rir um país que não está habituado a rir" - disse Carlos do Carmo, numa saudação final a Solnado.
Como disse, o trajecto profissional de Solnado e as suas qualidades artísticas entram quase em segundo plano neste contexto. Aliás, quase todos os que falaram e o conheciam de perto, destacaram em primeiro lugar as suas qualidades humanas.
"
É do Povo, é um dos últimos artistas acarinhado pelo Povo", destacou Vítor de Sousa. Num país onde reinam os "Chunga-Chiques" (como os apelida, e justamente, um amigo meu), Solnado era um oásis no deserto de talento que existe no nosso país.
Ele fazia rir. Perdão, ele ainda hoje faz rir. 40 anos depois vejo "
Zip Zip", "
Quem Te Viu e Quem TV" ou a sua famosa "
Guerra de 1908" e rio desalmadamente. Por falar em "almada", quase nem queria acreditar quando soube (na RTP Memória) quem foi o primeiro convidado do "
Zip Zip": José de Almada Negreiros, um dos artistas que englobou a chamada Geração de Orpheu e que escreveu um dos melhores textos que já li na vida: "
Manifesto Anti-Dantas", magnifico.
Um cruzamento de gerações absolutamente imperdível e inesquecível.
Raúl Solnado contornou através da sua "
Guerra de 1908", da forma mais inteligente, graciosa e corajosa a censura ao regime ditatorial vigente em Portugal, pela mão do Professor Doutor Marcello Caetano, abordando a Guerra Colonial em África.
Solnado é e será sempre, por isto, da Pátria.
Solnado é e será sempre, por isto, do Povo.
Que o Povo e a Pátria se unam para que ele seja imortalizado no palco, num hipotético Teatro Raúl Solnado.
"
Eu não me venho despedir... porque ele vai estar sempre comigo" rematou Francisco Nicholson, embebido em lágrimas, destacando assim a figura de Raúl Solnado.
Raúl é daqueles que não morre. Apenas vai ali e nós vamos já ter com ele. Entre uma coisa e outra fica a saudade dos que o adoram e a gratidão dos que o admiram.
Jorge Gabriel escreveu um dia palavras que nunca esquecerei, acerca da morte de outro Raúl (Durão): "
Eu lutei Raúl. Lutei muito, sofri outro tanto e chorei ainda mais. Mas consegui.".
Portugal, não o Povo mas a Pátria, faz o epitáfio de Raúl de forma semelhante: "
Portugal lutou Raúl. Lutou muito, sofreu outro tanto e contigo riu ainda mais. Mas conseguimos."
Conseguimos a Liberdade.
Lado a Lado.
Aos 79 anos, este é apenas um "Até Já" do Artista, muito contra a sua vontade como referiu Alice Vieira.
Com certeza, as suas últimas palavras para o Povo terão sido... "
Façam o favor de ser Felizes!".